Zé.

Clara Dantas
2 min readMay 18, 2017

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(Aviso de gatilho: assédio, pedofilia)

Pelo que me lembro, eu não tinha nem dez anos. Estávamos na casa de um “amigo” da família. O filho dele e meu irmão eram pequenos, mais jovens que eu. Costumavam brincar juntos.

Eu estava tomando banho na piscina. Minha mãe, a poucos metros de mim, conversava com outras pessoas. Então esse “amigo” (um senhor já com certa idade, mais velho que meus pais) se aproximou e me tocou, debaixo d’água. De início, eu não entendi. Achei que ele estava querendo chamar minha atenção, que iria me dizer alguma coisa. Eu era inocente.

O que é?! — eu perguntava.

Shhhh! — ele queria que eu ficasse quieta.

O “amigo” colocou a mão por dentro do meu biquíni. Passou os dedos na minha vagina, sem hesitar. Começou a me estimular, me masturbar. Eu não entendia o que era aquilo, mas senti vontade de chorar. Era meu corpo, ninguém podia tocar ali.

Percebendo meu desconforto, ele se afastou, alarmado. Chamei minha mãe e disse que precisávamos ir embora. Que aquele homem era “safado”. Não tenho ideia do que passou por sua cabeça, mas fomos, sem que ela me fizesse uma pergunta. Depois disso, em ocasiões em que o “amigo” estava presente, ela percebia que eu o evitava, mas não fez nada. Em vez disso, me recriminou por olhar para ele “de cara feia”.

Cresci. Finalmente compreendi o que havia se passado. Já na faculdade, depois de algumas sessões de acompanhamento psicológico, entendi o quanto aquele abuso ainda me perturbava. Contei tudo a minha mãe. O sentimento de impotência a esmagou.

O que aconteceria se ele fosse exposto agora? Provavelmente, nada. Ele tem dinheiro. É uma figura conhecida na cidade. Não deve nem lembrar do que me fez. Afinal, já faz mais de uma década. Com esse tempo, até um crime de homicídio teria sua punição prescrita.

De fato, uma parte de mim morreu naquele dia.

Hoje, 18 de maio, é Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes.

Deixo aqui minha experiência (até então desconhecida por muitos de meu círculo de amizades), para reforçar que, infelizmente, meninas e meninos estão vulneráveis a esse tipo de situação.

Assédio é uma violência mais comum do que pensamos e, em boa parte das vezes, vem de alguém próximo. Um “amigo” ou até mesmo familiar. Conheço inúmeros casos.

Para denunciar, disque 100.

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